terça-feira, 30 de agosto de 2011

Contando um conto

Aquela história de que sempre haverá um novo dia não é tão legal quando olhada do ponto de vista de domingo. Segundas feiras muito raramente são bem vindas. Mas ainda assim elas chegam, e nos aperta com a força de um dia comum. Lia sente o sol aquecer seu rosto e desperta, mesmo que meio forçadamente. São onze minutos sentada na cama, olhando a janela e se perguntando porque. O banheiro parece estar a quilômetros, e o chão nunca foi tão frio. O tornozelo grita devido a um antigo problema que nunca a abandona. Isso é bem a cara dela, problemas que vêm e grudam em sua vida tornando-se parte dela. Na verdade, hoje, nem vida é mais. É apenas um monte de problemas amontoados caracterizando uma pessoa, fria, parada, sem muito ânimo ou ânsia de viver. A pia lhe serve de apoio enquanto se olha no espelho tentando se lembrar do dia anterior. A maquiagem pesada e agora extremamente borrada remete a lembranças não tão claras. Talvez tenha sido uma puta festa ou não. Mas soa bem mais como uma roda na casa de alguma amiga, com outros amigos e música. Seja o que tenha sido havia bebidas, bebidas altamente alcoólicas. O que antes não demorava quinze minutos, hoje leva quarenta. Da vizinha vem o cheiro de café, tão quente e agradável quanto o líquido em si. O copo de leite gelado não desce, e as bolachas estão realmente sem graça. E ela sai, da mesma maneira de sempre, com as chaves na mão e pensamento lá no antes. São seis longos quarteirões até a loja onde trabalha. Depois de dois, atravessa uma avenida cortada por um pequeno rio. É pequeno e não possuí um cheiro agradável mas é cercado de belas árvores que ficam extremamente floridas algumas poucas vezes ao ano, dando-lhe motivos para continuar andando. Talvez seja um dia excelente mas muito provavelmente não. Os "bons-dia" jorram de todos os cantos e o relógio confirma sua desconfiança: Quinze minutos atrasada, como sempre. O dia começa mal e continua entendiante. Atravessa todo o ambiente de trabalho em busca da única coisa que lhe anima: a música. Empurrada canção após canção até que o relógio marque onze e meia. Como quase sempre imprevistos acontecem e só sai de seu cárcere aberto por volta do meio do dia. O caminho para casa é bem mais agradável e sorridente. A esta hora, leves traços de bom humor começam a aparecer. O almoço é rápido e sem graça se estiver sozinha, mais demorado e normal se estiverem todos em casa. Comer correndo, fazer tudo correndo, são as duas horas mais valiosas do dia. Variando entre trabalhos de faculdade atrasados, livros pra ler, sono e preguiça. E quando menos se espera duas horas já se foram e lá está Lia, de volta ao calçadão da cidade. A tarde passa inversamente proporcional ao nível de animação. E das quatro as seis o relógio simplesmente voa. A faculdade é um caso suportavelmente a parte. Tirando os falsos e estranhos, dá pra extrair bons risos. Logo a cama de colchão mole herdada da bisavó aparece e lá vai ela, para o único lugar onde se sente segura e realmente feliz, dentro de si mesma.


quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Mais leite que café

O tempo então passa, passou. Feriados, fins de semana, férias inteiras chegam e se vão como areia no vento. A distância pode ser pequena, mas aumenta conforme cresce a saudade. Não há como não sentir falta. Não são apenas lembranças, toda sua vida ficou para trás. A vida que você viveu até aqui, daqui para frente é outra história. Como comprar um caderno novo, você sempre se lembrará de algumas frases que era bem mais legais só que elas estão no caderno velho... Morar sozinho é legal, o problema é ficar longe das pessoas que você queria mais perto que qualquer outra. Seu desejo de comer lasanha não é mais realizado no domingo e se você se comportar bem mas, também não passa de uma bandeja de congelados. Você pode tomar quantos porres quiser, no dia que quiser, mas sabe... não vai ter ninguém que se importe tanto com você e isso não é tão legal quanto parece. Você pode virar noites fazendo trabalho, festejando ou jogando vídeo-game e isso realmente não fará diferença. Feijão talvez se torne o prato mais mágico do almoço e você finalmente descobre porque ela reclamava tanto quando você sujava muita louça. Suas conquistas não são comemoradas com abraços e festejos de todos ao seu redor, o máximo que você consegue é um parabéns e um gritinho de felicidade mas ao longe, pelo telefone. Emails, redes sociais, celular... a saudade geralmente fica tão grande que não cabe mais em lugar algum. As pessoas da sua cidade passam a perguntar de você e você realmente percebe que era notada e quem sabe, até querida naquele vilarejo de onde veio. As visitas da sua mãe ao seu quarto não são mais aterrorizadoras e se tornam a cada segundo mais desejadas. Um carinho, um olhar, ou até as broncas fazem falta, tanta falta. Você começa a ficar triste sem motivo, e se afunda em chocolates torcendo para que seja tpm e não é. Você sabe que não é. Sentimento mais urgente que existe, porque me torturas tanto? Você enjoa das músicas e dos seus filmes prediletos. Enjoa das piadas, das conversas e das companhias. Quer apenas uma coisa: pisar no chão vermelho onde você aprendeu a andar. Ver aquele monumento ridículo que você adorava zoar ainda lá, do mesmo jeito e seus olhos enxerem de lágrimas sem se conter. A igreja ainda está lá, caminhando lentamente em sua reforma que já dura onze anos. É necessário sair para que se possa sentir saudades. E talvez seja não só o sentimento mais urgente, mas talvez o mais necessário. Aniversários, festas, datas, tudo vai vem e o máximo que pode fazer é mandar uma mensagem ou telefonar. As roupas não terão o mesmo cheiro mesmo que use o mesmo amaciante e o mesmo sabão em pó. Têm bagunça por toda parte, no quarto, na cozinha, no coração. Jogando roupas pelo quarto como quem se livra de dores que pensam-lhe a alma. Não resolve, você sabe que não. Ninguém va arrumar seu quarto, ou berrar até que você arrume. É simples, se você esquece roupas no varal e chove, tudo vai molhar. Não tem mais almoço pronto te esperando no fogão, nem café da manhã arrumadinho na mesa, é você por si e ninguém mais e isso as vezes cansa. Sei lá, as vezes a saudade ultrapassa seus limites e suas medidas; Passa de saudade para solidão, não se pode conter. Talvez nem seja tudo isso que parece, e a dor seja bem menor. Talvez eu só precise de um descanso, um abraço ou alguém que pelo menos pareça se preocupar. Desculpem-me pelo desabafo mas, saudade dói, e não me ensinaram a sofrer.



sábado, 13 de agosto de 2011

Alumbramentos

Uma noite amena de agosto, um auditório cheio porém humilde. Agosto dos grandes espetáculos. Seriam três aulas de Redação Publicitária II mas acabaram por ser uma das experiencias mais lindas que tive em vida. De início ficaram ecoando na minha cabeça vozes que me faziam tentar querer achar um motivo para ter ido a faculdade naquele noite, pergunta logo respondida. Peguei meu material, saí, atravessei o estacionamento, cheguei, entrei, sentei. Até então parecia um convite para um cochilo, um ótimo cochilo. Pessoas da cidade dividiam as poltronas com boa parte das turmas de comunicação. Flashs, risos, assuntos aleatórios e enfim, as luzes se apagaram. Uma voz feminina avisa que as fotos e filmagens são proibidas se não possuírem um aviso prévio. Há muitos, mais muitos anos mesmo que eu não assistia uma apresentação de Balé. Uma luz acende no palco, e em foco um homem seminu inicia o espetáculo. Não há como descrever o que se sucedeu. Movimentos perfeitamente sincronizados maravilharam meus olhos. Poesia em dança, balé de música. Inspirados nas obras de Manuel Bandeira, suas influências e vivencia poética, o Balé me ocupou por pouco mais de uma hora. Uma das horas mais bem ocupadas em minha vida. Uma sequência de ritmos, versos e gestos. Como um amigo me disse, é como tentar descrever o gosto de uma laranja. Não havia cenário, e o figurino foi mínimo, bem ausente mas não faltou conteúdo. Instante único de conhecimento da vida, como o próprio Bandeira definia Alumbramento. Grandiosos espetáculos. De sons eletrônicos, a batidas africanas e samba brasileiríssimo. Um banho. Lavou minha alma. Encerrou-se assim, calmo, delicado como quem avisa antes que vai partir. Como um círculo perfeito, terminou exatamente da maneira que começou, um pouco mais suado porém igual. Espero que Frutal continue me surpreendendo assim, me enchendo de arte e de vida, ou só de uma, afinal, não consigo separá-las.

Parabéns a Cia de Balé de Rio Preto



segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Sertralina

Mais uma vez voltei, no mesmo lugar, parada, sem reação. Prometi que nunca mais seria assim, jurei, tudo em vão. O chão novamente em cima de mim, e até o ar parece me abandonar. Tudo vazio e escuro, tenho medo. Eu não quero muito, apenas alguém que segure a minha mão. Todo mundo ouve, e ninguém me escuta na verdade. Eu quero algo além de gritar, quero que alguém me socorra. Não tenho chão e não me ensinaram a flutuar. As coisas acontecem sem que eu possa ter controle. Sozinha de novo, palavras não me deixem. As vozes estão todas aqui, ecoando sem fim. Em pé num desfiladeiro infinito,  e frio. Eu não queria nada de volta, achei que tinha deixado tudo para trás, mas de novo me enganei. Vivo de erros, me enganando sempre. Não queria elas de volta mas estão todas aqui. Os médicos e os amigos te dizendo para que não fique assim, como se isso bastasse. Não é legal, eu sei que não, mas é mais forte que eu e mais uma vez eu fui fraca. Não posso ficar sozinha, solitária sou mais frágil que um recém-nascido, começando a vida do zero. Fui fraca e as vozes voltaram. Pedi pra eles saírem. Por favor Fredie, tire eles daqui. Chega, não quero de volta. Cinco anos atrás eu cai no mesmo buraco e não vou voltar. Escrever sorrateiramente como quem chora em silêncio para não se deixar morrer. Não estou louca, só não quero sair daqui enquanto Pandora não vier cantar pra mim. Afinal tudo estará bem enquanto você tiver uma cartela de remédios controlados ao seu alcance.