sábado, 26 de março de 2016

Retorno

Décimo terceiro dia no inferno. Não há previsão de partida.
O outro lado é algo abstrato agora, realmente nunca havia pertencido-a. Eu avisei à ela, para que não bebesse da fonte dos tolos mas preferiu ser humana à manter sua sanidade. Disse-a várias e várias vezes para que não se distraísse, utopias são vendidas em todas as esquinas, não opte pela cegueira. Entretanto, lá foi ela, destemida e indefesa como um bebê que foge do berço pela primeira vez. Escolheu entre as verdades um conto de fadas torto e clichê. Só mais um príncipe encantando que se entendia da sua própria história e foge, como se nada na vida valesse a pena mesmo. É de propriedade dos tolos todas as tolices envolvidas. Todos as juras de amores absurdas, todos os risos e toda a paz que eles formavam, juntos, dissipara-se. Ela precisava acreditar em sua felicidade tão forte e tão fielmente que esqueceu de se manter lúcida. Não sobrou nenhum jantar à luz de velas, ninguém pra acordá-la dos pesadelos com abraços. Tudo parece tão distante agora. Eu tento ajudá-la como posso, mas não há o que se fazer. Esse abandono dói porque é como se você tivesse se abandonado. Oras, outra parte sua é levada embora sem que você possa fazer nada para impedir. Sobra só o vazio na cama, o buraco dentro de você. O corpo cansado, a vontade de dormir por mais do que o necessário. Fica a falta de paz, as alucinações, o choro constante.
Cuido dela à muitos anos, poucas vezes a vi tão distante. Não seria a história dela se não viesse mais uns meses chorando por um amor que ela não pode ter. Infeliz e fielmente é assim que deve ser, tal como uns nascem para serem médicos, Laura nascera pra sofrer por tudo que ela quis ser e não pode. Vinda apenas e exclusivamente para integrar o grupo dos azarados, dos boêmios e poetas. Toda a outra parcela de população que não está na capa das revistas. Eu sei que sonhar é um bom meio de manter a vida seguindo mas eu deveria alertá-la sobre os altos preços que pagamos pela felicidade, talvez eu não esteja aqui por muito tempo mais. Vivemos nossas vidas por superestimar, acreditamos desesperadamente de que estamos e vamos ser felizes que as coisas deixam de fazer sentido, e ela precisa aprender a não se machucar.